A Sega na F1 de Ayrton Senna – Parte 1
Por:
mcs (Marcos Valverde)
00Agent (Rafael Fernandes)
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Genesis Does What Nintendon’t
No início dos anos 90, o lançamento americano do Sega Genesis – conhecido tanto no Japão quanto por aqui como Mega Drive – simbolizou o objetivo da empresa em ter uma parte maior do mercado de games dos Estados Unidos, que, na época, estava tomado pela Nintendo. Para alcançar tal objetivo, a estratégia da Sega consistia em atacar diretamente sua rival (com a frase “Genesis Does What Nintendon’t”) e atrair os jogadores adolescentes e adultos, que deixavam de jogar o NES para frequentar os arcades – segundo o diretor de Marketing da empresa na época, Al Nielsen, não apenas os arcades traziam uma experiência audiovisual mais completa, como também o fato de que maior parte dos fliperamas ficavam nos shoppings, onde as garotas também frequentavam. Com grandes sucessos produzidos pela Sega para os Arcades – como Golden Axe, Space Harrier, After Burner e Out Run – a afirmação de que o console de 16-bit da Sega era a máquina mais adequada para rodar com perfeição esses clássicos caiu como uma luva para atrair os jogadores mais crescidos.
Para ir mais além e satisfazer esse público com jogos originais de qualidade, a empresa investiu na produção de vários games baseados em diferentes modalidades esportivas. Mas não apenas nisso; cada jogo era estrelado por personalidades representantes de cada esporte, resultando em um dos primeiros casos de licença de uso de imagem de uma pessoa real em um jogo de videogame. Como exemplo, podemos citar jogos como Joe Montana Football – o que fez mais sucesso na época, principalmente pela narração em áudio, que era algo novo – Pat Riley Basketball, Arnold Palmer Tournament Golf, Tommy Lasorda Baseball, Mario Lemieux Hockey. A estratégia não só provou ter como resultado nas vendas, como também da crítica especializada, que considerava os jogos bastante realistas. Isso para citar apenas as estrelas do esporte; não se pode esquecer de Michael Jackson´s Moonwalker, um grande sucesso nos arcades e no console de 16-bit. Apesar de, para o mercado ocidental parecer uma ótima idéia, a Sega of Japan nunca viu com bons olhos o alto investimento na licença para utilização de imagem apenas para promover o game.
Comercial da Sega nas TVs americanas, mostrando jogos de sucesso dos arcade, mais as licenças exclusivas.
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Siga Senna
Porém, após o plano ter dado certo e o console ter finalmente uma base estabelecida nos mercados americano e europeu, ficou definitivamente provado que, dependendo do jogo, a associação de imagem de uma personalidade ao game aumenta em muito as vendas, e atrai o consumidor. Partindo dessa premissa, a própria subsidiária japonesa ficou a cargo de desenvolver uma continuação para Super Monaco GP – um game que obteve sucesso modesto nos arcades, e uma ótima conversão para o Mega Drive em 1989, com direito até a duas notas dez da EGM (!) – com a participação de ninguém menos que Ayrton Senna.
O piloto brasileiro era tido como um mito no Japão; em 1987, Senna corria na equipe Lotus, que utilizava motores fabricados pela Honda. Assim, foi estabelecida uma grande amizade entre o brasileiro e Soichiro Honda, presidente da fábrica. Após mudar-se para a Mclaren no ano seguinte – que passou também a utilizar os motores japoneses – e se tornar campeão de forma heróica pela equipe no GP de Suzuka, Ayrton passou a ser, de fato, admirado pelos japoneses.
No vídeo abaixo, que mostra sua última passagem em Susuka pela Mclaren Honda, encontrando-se com o presidente da Honda e sua esposa, além de visitar vários programas de TV, percebe-se exatamente o tamanho desta adoração dos japoneses pelo piloto:
Ayrton Senna era tão adorado pelos japoneses que referências ou menções diretas ao seu nome ou à sua imagem chegaram a aparecer em diversos setores da cultura japonesa, desde mangás a séries tokusatsu, passando, é lógico, pelos games. E vale aqui uma curiosidade: a Sega chegou a incluir Ayrton Senna já em Super Monaco GP do Mega Drive. Isso se deu através de um piloto brasileiro misterioso chamado G. Ceara, que aparecia lá pelo início da segunda temporada e que durante muito tempo era considerado invencível pelos fãs do game (só depois de muito tempo conseguiram descobrir como derrotá-lo). Veja a semelhança:
Ayrton Senna nas pistas da Sega
Com tudo isso, era imprescindível que Ayrton Senna’s Super Monaco GP II contasse com a presença do ídolo e tri-campeão (1988, 1990 e 1991) o que, de fato, ocorreu. Senna participaria na produção do game, influenciando diretamente no seu sistema de jogo através de informações técnicas. Há uma matéria excelente na edição #5 da revista Supergame sobre esta participação:
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Logo na tela título há uma imagem digitalizada em alta qualidade de Senna, e o mesmo vai acontecendo nas telas seguintes. Além disso, cada prova contém um texto introdutório, como se fosse um briefing da prova, dado pelo próprio piloto. Não só a imagem de Senna foi utilizada, mas também a voz, em mensagens como “Go!” e “Congratulations”. Esse tipo de contribuição de Ayrton para o jogo não somente traz uma maior imersão ao jogador, como também o faz identificar-se com o próprio piloto.
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Porém, parece que a colaboração de Ayrton não se deu de apenas em algumas telas do menu de jogo: toda a produção do game em si teve consultoria do piloto, o que incluem os gráficos, jogabilidade, orientações técnicas sobre os carros e as pistas. Em relação à sua versão anterior, Super Monaco GP II possui gráficos melhorados, mais fluidos e uma jogabilidade um pouco mais semelhante à realidade – guardadas as devidas limitações de hardware – o que gerou algumas críticas por parte das mecânicas de jogo; por exemplo, ao bater em um carro, a velocidade é reduzida drasticamente, e a CPU sempre levava vantagem quando isto ocorria. Dessa forma, o jogo foi considerado por alguns muito mais difícil em relação a seu antecessor, exigindo muito mais das habilidades do jogador, o que pode ter afastado alguns jogadores. Por outro lado, Senna pediu para que fosse tirado o choque do seu carro com a zebra, já que a mesma seria usada na realidade para melhor tangenciar as curvas. Isto facilita a vida do jogador em algumas curvas mais fechadas.
O som teve uma sensível melhora nas vozes digitalizadas, em maior qualidade – seu predecessor tinha vozes tão roucas que eram quase incompreensíveis – mas os efeitos sonoros e música sofreram uma queda de qualidade, principalmente no som que retrata os carros adversários.
Uma contribuição especial de Senna foi a inclusão de duas pistas desenhadas pelo próprio piloto, além de um terceiro traçado: o de seu kartódromo particular na cidade de Tatuí-SP (imagem abaixo)
O jogo não possui a licença de uso dos nomes de pilotos (além de Ayrton Senna) e equipes, então a solução encontrada foi substituir estes nomes por outros que de alguma forma lembrariam seus equivalentes reais. O “Leão” Nigel Mansell, por exemplo, é representado pelo piloto inglês N. Jones:
Veja a lista completa de quem é quem em Super Monaco GP II na página do jogo na Wikipedia.
Apesar de não significar um grande salto em relação ao primeiro jogo, Ayrton Senna Super Monaco GP II foi muito bem recebido pela crítica especializada, principalmente a nacional.
Comercial Japonês de Ayrton Senna Super Monaco GP II
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Welcome to the Next Level
Esta primeira parte da matéria mostrou a estratégia da Sega de associar-se ao ídolo mundial da F1 Ayrton Senna para ganhar importantes fatias do mercado mundial de games, consolidando-se com o game Super Monaco GP II. A segunda parte da matéria trará o avanço da Sega no uso deste marketing, desta vez não mais limitado por pixels de um game. Para finalizar a parte 1, uma CG incrível dos carros usados ao longo de toda a carreira de Ayrton Senna:
Senna vs Senna
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Referências:
Cara, excelente artigo! Super Monaco GP já era bom, com o Ayrton Senna então se tornou obrigatório! Infelizmente nunca joguei a versão do Mega Drive, só a do Master System. Mas vou ver se ainda hoje jogo essa belezinha.
Essa estratégia da Sega que você mencionou me lembrou de um artigo extenso mas muito interessante da IGN sobre a história da Sega e como foi a luta da Sega americana contra a Nintendo e contra a própria Sega japonesa. http://retro.ign.com/articles/974/974695p11.html
Ah, eu comecei um blog de jogos antigos de plataforma, que tal uma parceria? Segue o link: http://sidescrollcastle.wordpress.com/
Abraços
Que bom que gostou Adinan! Essa é a primeira matéria do nosso blog feita "a 4 mãos", não foi fácil fazer (confirmar ou não informações interessantes, dar sentido ao todo, etc.) mas no fim ficou do jeito que queríamos.
Parece ser bem interessante o link, vou ler assim que tiver um tempo sobrando. Na minha opinião grande parte da rivalidade entre Sega x Nintendo deu-se por conta da ousada e agressiva estratégia de marketing da Sega USA, alimentada depois pelas publicações oficiais de games ao redor do mundo.
Parceria feita! Abraços!
Pode crer, deve ter dado um trabalhão fazer esse artigo, mas valeu a pena com certeza! Deu saudades não só do game, mas também do grande Ayrton nas pistas.
Ah, e valeu pela parceria, já te adicionei também no meu blog! Abraços!
É legal lembrar que a memória do Senna também apareceu nos dois jogos Ayrton Senna Kart Duel para Playstation japones, mas estes não chegam nem perto do ASMGII.
Nas pesquisas sobre esta matéria até levantei o nome de alguns jogos em que Senna aparece. Mas achei que ia desvirtuar um pouco o foco dessa Parte 1.
Há uma chance de aparecerem na Parte 2, mas só quando estiver escrevendo a minha parte da Parte 2 é que verei se há espaço para outros jogos serem citados.
AS SMGP II é diferente por todo o envolvimento de Senna na produção do jogo, mostrando uma estreita relação com a Sega, além do valor histórico do mesmo.
Nunca gostei de jogos de fórmula 1.
Mas achei interessante a estratégia pra colocar os pilotos, se parece com o que eles fazem com os jogos de futebol.
Ótimos Post!
Valeu Gabriel!
Aguardem a continuação desta matéria, será excelente!