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Shigeru Miyamoto diz que se dedicará a projetos menores, e isso é muito bom. Entenda o porquê

Em uma notícia extraordinária, Shigeru Miyamoto revelou em uma entrevista à revista Wired que deixaria suas funções administrativas e de supervisão na Nintendo para se dedicar a projetos menores, dos quais pode ter maior envolvimento. “Eu quero mesmo é estar novamente na linha de frente da produção de um jogo” declarou o criador de Super Mario Bros. e The Legend of Zelda. “Pretendo trabalhar em um projeto menor com desenvolvedores mais jovens. Ou então fazer algo do qual eu mesmo possa criar e produzir. Algo realmente pequeno”

Ainda de acordo com ele, esse projeto deve ter início em 2012, com uma divulgação completa mais adiante, ainda no mesmo ano. “Em outras palavras, não quero mais me envolver com coisas que envolvem cinco anos de trabalho”, disse à revista.

Em resumo, Miyamoto deixaria de executar uma função da qual era atribuída a ele por quase 10 anos. Algumas pessoas já afirmam que ele está se aposentando, que irá deixar a companhia e se tornar um produtor independente. Não é bem assim. Em contrapartida, inclusive, a Nintendo emitiu um comunicado oficial afirmando que  “suas funções não serão modificadas (…) ele estará apenas encorajando os desenvolvedores mais jovens para terem mais iniciativa e responsabilidade pelo software que produzem”

(13/12) ATUALIZAÇÃO: Agora parece que o próprio Miyamoto decidiu desmentir o que falou. Segundo ele disse ao San Francisco Chronicle, enquanto que realmente irá ter participação em projetos de menor escala, isso não quer dizer necessariamente que irá se aposentar.

As ações da empresa caíram 2%.

Para entender melhor os possíveis motivos de seu menor envolvimento com os grandes jogos da empresa, vamos elaborar alguns tópicos com aparentes razões das quais o faria tomar uma decisão dessas, sendo definitiva ou não.

A idade chega para todos

Miyamoto está com 59 anos, e enquanto que há o consenso geral de que os japoneses não envelhecem, isso também acontece com eles. Apesar de que a idade para aposentadoria está fixada em 65 anos de acordo com as leis trabalhistas do Japão, ainda podemos esperar muitas outras contribuições dele para o mercado de games dentro do período que lhe falta. Contudo, para jogos tão massivos quanto nos que ele estava trabalhando até então (como Legend of Zelda: Skyward Sword, por exemplo), o tempo de produção era realmente muito grande, cansativo, e talvez nem tão satisfatório para suas aspirações. Podemos considerar a decisão de Miyamoto como uma retirada “lenta e gradual”, ao mesmo tempo em que se livra das atividades mais estafantes do processo de produção de um game mais, digamos, “blockbuster”, como talvez um Zelda para o Wii U. No entanto, continuando na Nintendo, é impossível que ele não ocasionalmente contribua com ideias para projetos maiores como esse; ele apenas está se desfazendo da obrigação constante de tal ato.

Miyamoto é um artista, não um produtor

Graduado pela Kanazawa College of Art, ele ingressou na Nintendo no início dos anos 80 como um game designer. E qual era sua função, afinal? Ora, criar personagens, ambientes, estórias e formas de jogo e transpô-los ao game, de acordo com as limitações oferecidas pelo hardware. Sua visão diferenciada aliada a novas ideias que estabeleceram paradigmas na indústria foram os fatores que o levaram a chegar até o cargo de produtor, gerente e supervisor; funções que, embora trazem prestígio e retorno financeiro, nem sempre estão envolvidas com o processo criativo de um game, por onde ele despontou. E Miyamoto estava preso nisso, em atribuições administrativas de um projeto. É impossível ler a mente de alguém, mas pode-se concluir daí que sua intenção é a de retornar às raízes, colocar a mão na massa em algo do qual realmente ele sinta prazer em fazer e possa inovar à vontade.

Falando nisso, estamos longe de considerar os consoles da Nintendo de saturados de suas franquias, mas provavelmente havia um certo cansaço de estar trabalhando sempre com as mesmas propriedades intelectuais. Claro que Miyamoto nos apresentou Pikmin, Nintendogs e os jogos básicos do Wii, mas ele sempre retornava às franquias que havia ajudado a criar há 20 anos atrás, se encontrando no dilema de trazer algo novo ainda que preso aos elementos que fizeram estes jogos terem sucesso em primeiro lugar e dos quais não pode se desfazer. Criar personagens e universos totalmente novos deve ter sido sua intenção por trás da atitude tomada.

Em um programa de TV de 2003, da série “Outrageous Fortunes” da BBC, Miyamoto fala brevemente sobre sua função na Nintendo, ao responder à pergunta de um fã, e o quanto se sente mais satisfeito em fazer jogos do que administrar funcionários:

Produzir jogos de sucesso não é mais uma atividade prazerosa

Peço desculpas se soar anti-capitalista. Não é minha intenção.

Miyamoto sabe como ninguém que a indústria dos games chegou, de fato, ao status de “indústria”, gerando uma receita financeira maior do que a de Hollywood, atraindo assim cada vez mais empreendedores para o capital atrativo que vem dos joguinhos. Com isso, as empresas desenvolvedoras de jogos crescem, mas também têm de manter seu crescimento a fim de gerar mais dinheiro a seus acionistas. E como fazer isso? Vendendo milhões. E como vender milhões? Com jogos que todos sabem que as pessoas vão comprar.

Por isso, assim como em outras indústrias culturais como a fonográfica e a cinematográfica, é perceptível uma produção de conteúdo pragmático destinado para imediato consumo da massa, com investimentos altíssimos em valores de produção e pouca inovação, com o intuito de alcançar a meta de vendas e, consequentemente, a sustentação da companhia que o produziu. E, seguindo também o exemplo da música e do cinema, o que salva todo esse esvaziamento são os artistas independentes.

Para aqueles que não são indies e trabalham em uma grande empresa de jogos, há sempre a urgência e a pressão de conseguir resultados com aquilo que se está produzindo. E em um mercado cada vez mais competitivo, não há grande chance para investir em novas coisas senão aquelas em que há certeza de que vai dar certo; por isso temos uma enxurrada de continuações, saturação de gêneros (que se estende desde a década de 90, com o advento dos jogos de luta e de plataforma), entre outras mesmices.

O diferencial da Nintendo em relação à todas as outras é que ela sempre busca a inovação; porém, quantas pessoas você viu torcendo o nariz pelo Wii U? E quantos Zelda nós temos até o momento por console lançado pela empresa? É disso que Miyamoto está tentando se distanciar: da pressão absurda por jogos, da necessidade de trabalhar sempre com a mesma coisa (e da necessidade de inovar por inovar), de lidar com equipes e projetos enormes e executivos que entendem mais de finanças do que jogos. Isso não é novidade na conjuntura atual dos games, com grandes nomes saindo das empresas e abrindo softhouses pequenas, que ocasionalmente acabam prestando serviço para as grandes companhias – como a Kojima Productions e a Prope de Yuji Naka, como alguns dos exemplos.

E, como artista, Miyamoto deve possuir uma inquietude absurda que apenas o impulsiona a trabalhar com novas coisas. E são essas coisas das quais ele pretende trabalhar, ao mesmo tempo em que guia os novos desenvolvedores na produção de jogos. É um tempo de experimentação, e ele tem mais do que direito de ter esse momento.

Concluindo

Assim, ninguém perde com essa decisão feita por ele. Muito pelo contrário, todos ganham; nós, com novos jogos e experiências, e ele, que pode trabalhar tranquilamente com coisas que sabe que o deixarão satisfeito, sem deixar de pertencer ao conselho administrativo da Nintendo. Seria apenas egoísta lamentar sua partida dos jogos mais importantes como Zelda e Mario, como se todos os jogos atuais e futuros dependessem dele e de suas ideias. Enquanto a Nintendo se permitir, novos talentos e inovações virão – muitos deles através da ajuda de Miyamoto. E novos games sensacionais continuarão existindo.

Ex-colaborador do Passagem Secreta.

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Categories: artigos, notícias
  1. 8, dezembro, 2011 em 09:41 | #1

    Por mais que seja impossivel pensar na Nintendo sem o Mestre Myamoto a gente um dia vai ter que se acostumar com a idéia pq ele não vai viver pra sempre né? Força Myamoto!

    • 9, dezembro, 2011 em 09:12 | #2

      Pois é, acho que isso faz pensar que, mesmo sendo uma indústria relativamente nova, uma hora os ídolos vão ter que parar dessa vida, vão morrer… Só quero ver se as pessoas vão ter maturidade pra entender isso.

  2. 8, dezembro, 2011 em 10:16 | #3

    Eu também acho a notícia excelente, Rafa. E nessa de fazer jogos "menores" a gente vai acabar é ganhando uma cacetada de novos clássicos que, com as prováveis sequências, vão acabar se tornando jogos enormes que nem outras franquias que ele criou, he he…

    Maravilha, a Nintendo precisa mesmo de coisas novas, e o Miya (sentiu a intimidade?) é o cara perfeito para isso.

    Fui conferir as fontes do seu post e tava rolando de rir aqui, vendo como a Nintendo deve ter mandado um "pombas, Miya, cala a boca que as ações vão cair!" Os caras saíram negando tudo desesperadamente, he he…

    • 9, dezembro, 2011 em 09:32 | #4

      "Eu também acho a notícia excelente, Rafa. E nessa de fazer jogos "menores" a gente vai acabar é ganhando uma cacetada de novos clássicos que, com as prováveis sequências, vão acabar se tornando jogos enormes que nem outras franquias que ele criou, he he…"

      Putz, bem pensado, isso é um ciclo infinito! hauhuahua!

  3. 8, dezembro, 2011 em 11:59 | #5

    Tava até demorando acontecer algo do tipo, eu com metade da idade dele já não tenho lá muita paciência pra muita encheção de saco no trampo, imagina ele com uma responsabilidade infinitamente maior? O cara é um ser humano como qualquer outro, deixa ele na dele. É bom que a Nintendo já vá se adaptando a essa realidade.

    • 9, dezembro, 2011 em 09:18 | #6

      Pois é. Tem que gostar muito do que faz para aguentar tanto tempo e parecer ser tão bem humorado com a imprensa e os fãs.

  4. 8, dezembro, 2011 em 17:41 | #7

    Só espero que, a exemplo de Sonic, não inventem um Evil, Nervoso, Radical, etc… Mario e aposentem o clássico.

  5. 8, dezembro, 2011 em 21:36 | #8

    Pô, parece uma decisão acertadíssima: um gênio como ele se debruçando em "projetos menores", certamente livre das amarras de uma grande produção como Skyward Sword. Como o Orakio citou no comentário, é porta aberta para novos clássicos… já pensou um jogo de aventura sem os nomes "Mario" e "Zelda" conectados ao Miyamoto? Pode salvar a indústria da estagnação…

    Ou seria a Nintendo querendo entrar no mercado de mobile com jogos casuais feitos por… Shigeru Miyamoto himself? 😛

  6. 9, dezembro, 2011 em 01:47 | #9

    Achei ótima essa decisão dele. Podem existir muitas ideias guardadas por ele durante todos esses anos, o que significa que podem vir ótimos jogos por aí. Além disso, o fato dele trabalhar com novos desenvolvedores vai trazer ideias novas para a Nintendo e provavelmente novos talentos. 😀

    • 9, dezembro, 2011 em 09:20 | #10

      Sim, acho que a ideia é essa, fazer sucessores à altura dele para continuar o trabalho que ele tem feito há mais de 20 anos. É algo quase medieval, treinar um aprendiz para algo cuja habilidade é única… 😛

  7. 9, dezembro, 2011 em 09:37 | #11

    Aí vão dizer que ele se prostitiuiu, no mínimo… rs

  8. 9, dezembro, 2011 em 13:29 | #12

    Quem sabe ele se focando nas coisas que realmente goste saiam mais jogos que tenham lugar entre os clássicos eternos criados por este gênio. Pode parecer num momento uma má notícia, mas depois parece ser ótimo.

  9. Juliano
    9, dezembro, 2011 em 20:27 | #14

    Gostei de tudo que tu escreveu.
    principalmente essa parte:
    "O diferencial da Nintendo em relação à todas as outras é que ela sempre busca a inovação"

    Nintendista como sou, espero muitas coias boas vindo por aí.

    • 9, dezembro, 2011 em 22:07 | #15

      Não sou Nintendista, mas torço muito pela Nintendo. Parece que tem muita gente que por algum motivo quer ver a empresa na lama, ou passando dificuldades. Eu espero que não, já que ela sempre avança nos paradigmas da indústria.

  10. 9, dezembro, 2011 em 21:18 | #16

    Mas não estou comparando. Estou dizendo que espero que o nível de Mario, sem Miyamoto, não chegue ao atual (ok, pelo menos até Generations, que dizem ser bom) de Sonic.

  11. 11, dezembro, 2011 em 18:43 | #18

    Cadê o botão da estrelinha Like?

    Acho fenomenal a notícia, principalmente se isso resultar em um "Miyamoto Indie" lançando jogos para os WiiWare da vida. A Nintendo perde muito em não incentivar produtoras independentes á lançarem seus jogos em seus consoles via download. Creio que logo essa modalidade venderá mais que muitos clássicos que vem se saturando e necessitam serem reinventados.

    • 11, dezembro, 2011 em 19:27 | #19

      Falou e disse, Ighor. Vamo ver no que vai sair dessa decisão do tio Miya.

    • 12, dezembro, 2011 em 00:55 | #20

      Esse botão é nativo do WordPress.com, para blogs hospedados no WP, então, pelo menos por enquanto, não temos.

      Mas aqui há o curtir do Facebook, além disso há a tal estrelinha na visualização de RSS do Google Reader, além de uma espécie de "Like" para celulares Android que usam um cliente do Google Reader. ^^

  12. 12, dezembro, 2011 em 10:15 | #21

    Fiquei surpresa com a notícia quando saiu, mas tbm não foi o escarcéu como muitos fizeram. Entendo que é ruim para a Nintendo por conta de ações que obviamente cairiam, mas é por isso tbm q as vezes acho q a indústria atrapalha a mente criativa de muitos designers. Bom, por isso que eu adoro indies e muitas vezes odeio publishers. 😛

    E só um detalhe, (game) designer é MUITO diferente de artista (game artist)! Cuidado para não confundir!

    • 12, dezembro, 2011 em 11:09 | #22

      Mas isso é mais nomenclatura da hierarquia do processo de produção de um jogo do que de fato uma definição, não? Sendo designer ou artist, ambos participariam do processo criativo do jogo, logo fariam um trabalho artístico. Ou tô errado?

      • 12, dezembro, 2011 em 12:19 | #23

        Na verdade não, mas não estou reclamando não! xD É devido ao infeliz termo "designer" no "game designer", daí no Brasil esse tipo de confusão ocorre muito. Claro, em muitos casos o game designer tbm é um artista e o game artist tbm acaba contribuindo no design do jogo, mas não é uma regra. Design do jogo diz respeito a jogabilidade, fases, enredo, o que e como vai ser cada aspecto do jogo, como deixar agradável, não muito dificil mas não muito fácil… é mais um arquiteto. Já o artista cuida somente da parte artistica do jogo, da arte, dos desenhos, das animacoes, do concept art, da arte dos personagens, etc. Ele nao precisa ter conhecimento de como o jogo terá que se comportar na maioria das vezes.
        Claro que ambos participam do jogo, do desenvolvimento e da arte que é o jogo, em muitos times as pessoas devem se comunicar e ter um bom conhecimento do todo (ou pelo menos deveriam na minha opinião). Mas os termos são bem diferentes (as vagas nessa área diferenciam bem entre game artist e game designer).
        Miyamoto provavelmente tem conhecimentos artísticos devido a formação universitária e provavelmente é um artista, mas é mais conhecido como game designer.
        Desculpe-me o texto longo!

        • 12, dezembro, 2011 em 12:34 | #24

          Aaah sim, desculpe se entendi errado! E valeu por esclarecer isso bem. No caso do tio Miya, parece que as contribuições dele misturam ambos os conceitos então, já que ele não só criou o personagem Mario, como também a mecânica do jogo onde ele foi inserido originalmente, não é verdade? Pelo menos é o que creditam ele a respeito… rs

          • 12, dezembro, 2011 em 12:38 | #25

            Sim, ele faz de tudo, é o tio Miya enfim ne? Entendo as ações da Nintendo cairem, o tio Miya faz tudo na Nintendo, sem ele não sei como seria a Nintendo de hoje! 🙂

  13. 12, dezembro, 2011 em 15:35 | #26

    Comentando depois de ler tudo e sem comentário nonsense agora ^^, penso que realmente é uma mudança boa, acho que a Nintendo conseguirá absorver de maneira adequada os novos projetos de Miyamoto, visto seu histórico de inovação.

    Mas também penso que é um primeiro passo para uma aposentadoria de fato. Lógico que é mais inteligente (até em níveis financeiros, né Nintendo?) isso ser feito aos poucos do quê um anúncio repentino e bombástico.

    Se bem que grandes gênios se negam a se aposentar de verdade daquilo que verdadeiramente gostam de fazer. Vide Oscar Niemeyer e outros.

  1. 12, dezembro, 2011 em 08:16 | #1

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